Os velhos

29 11 2017

Os Velhos

“Todos nasceram velhos — desconfio.
Em casas mais velhas que a velhice,
em ruas que existiram sempre — sempre
assim como estão hoje
e não deixarão nunca de estar:
soturnas e paradas e indeléveis
mesmo no desmoronar do Juízo Final.
Os mais velhos têm 100, 200 anos
e lá se perde a conta.
Os mais novos dos novos,
não menos de 50 — enorm’idade.
Nenhum olha para mim.
A velhice o proíbe. Quem autorizou
existirem meninos neste largo municipal? […]
Carlos Drummond de Andrade, in ‘Boitempo’ roubado ao citador
Hoje, na CMTV: velhos que  estão num lar ao cuidado da Santa Casa, atacados por gastroenterite, palavras que arrepiam por parte do  responsável… ele próprio pensando que não é velho… dizendo algo que soa a desprezo, afirmando que são velhos, é normal não é intoxicação alimentar, mas foram  20 para o hospital por decisão externa ao lar ( honra lhe seja feita quem quer que tenha sido, digo eu).
Homem morre em incêndio em casa, cai-lhe o telhado em cima, velho, sozinho, alguém reparou que faltava o telhado ao casebre onde vivia. Alguém obviamente idoso ou idosa, sabia quem lá vivia. Mas  é idoso, já nem dizem homem nem mulher ,em muitos casos, passaram apenas a ser idosos, outro nível de ser mulher ou homem (nos tempos que correm , nível obviamente inferior).
O fogo de 2017 , para além de despir as montanhas e vales, pôs a nu muita miséria que andava escondida nos montes, vimos as casas onde muitos portugueses ainda viviam, ou vivem, casas que nenhuma seguradora alguma vez seguraria. Teriam o luxo da eletricidade? Da água? Teriam casa de banho? Nem dá para perceber , depois dos incêndios ficam as paredes de pedra e escombros. Mas que interessa? São velhos, agora irão ficar onde foram acolhidos…ou não, se ainda tiverem forças para perguntar se não têm também direito à reconstrução da casita (ou alguém que os ajude nessa diligência).
Um país que envelhece habituando-se a estas notícias, gente como eu , sentindo-se muito jovem mas não o sendo, num instante seremos os  “idosos”…. já faltou muito mais, só achamos que não somos desses miseráveis que aparecem nas notícias, até escrevemos em blogues :-). Não, nunca seremos idosos… nós seremos sempre os “meninos”… Chamaria a isto soberba um dos sete pecados mortais , para quem não sabe nem nunca soube nem viu o “Seven”. Não é isto que transparece no poema? Pois não será, porém a soberba é dupla e também vamos achando que há muita gente que ainda cheira aos cueiros a botar opinião….
A velhice perdeu estatuto , já quase ninguém se lembra de sabedoria quando pensa em velhice e cada vez se aceita como normal um óbito aos oitenta mesmo se claramente evitável. A velhice é mais conotada com iliteracia  sobretudo a digital, com demência , sobretudo a do alemão… e mais um instante e ninguém nos leva a sério, já faltou mais, muito mais, mas nós escrevemos em blogues, somos da classe média , por isso, nada disto nos diz respeito…
O que me deu para escrever estas coisas que soam a repetidas , que já são conhecidas de todos, lugares comuns, todos sabemos que é triste, mas que se há-de fazer , é a vida… pensarão alguns. Que me deu? Estou apenas a ficar como o caro leitor: velha.




Amira Willighagen: Dueto das Flores-Lakmé (Delibes)

26 11 2017

Dueto com Corlea Botha

 

O tempo passa mesmo muito depressa, ainda ontem era uma garotinha, Felizmente não estragou a voz.





Está na altura de ir à feira do mel na Lousã

18 11 2017

Pois parece que o verão de São Martinho se prolonga e neste fim de semana lá iremos à feira da Lousã . Ontem estava tudo a queimar na Lousã, isto porque as notícias na rádio contradiziam as da televisão e vice-versa. Que já se podia, que afinal não se podia … Bem a Lousã estava coberta por uma neblina de cheiro a recordar o outro… de há um mês , salvo seja. Parece que em Mangualde correu mal, mas também não deu para perceber , na TV só filmavam verde , não se viam sinais de queimada, por isso não percebi se o homem se imolou ou se ficou na queimada …ou se foi dos antigos… muito confuso. Menos confuso foi o episódio do far west  de Poiares( questões de terrenos , neste caso em causa estavam 300m2, nos states é tudo maior) que acabou bem , umas escassas 24 horas depois, só com um ferido ligeiro, o de ontem, vítima do barricado.

Está na altura de vir cá uma banda  , um concerto , Fado ao Centro, qualquer coisa, o pessoal não tem cinema aqui, nem centro comercial, tenham dó.

 





Um país sem massa crítica, mas muita massa cinzenta

16 11 2017

Insuficiente massa crítica,mas sobra massa cinzenta… somos tão inteligentes…. sabemos sempre como resolver os problemas do planeta, mas assobiamos para o lado quando se trata do nosso bairro, do local onde vivemos, da  nossa escolinha, do nosso emprego, da nossa propriedade e do que a rodeia, das externalidades do que fazemos no nosso quintal ou na nossa “fazenda”,conforme o caso…. Massa cinzenta? Sim temos muita, é só viajar pelo centro do paíss, desde o pinhal de Leiria a Mira e depois para leste, o vale do Ceira, e por aí fora até Espanha. Ou um pouco a Norte passando por Anadia… e IP3 até Viseu…  É só massa cinzenta.

Eu diria que não temos é massa crítica para fazer diferente, para aproveitar a desgraça e corrigir erros, não temos, é um país pequeno , do qual saíram muitos , jovens, talvez os melhores… ficaram alguns (poucos) desses melhores, corajosos… e ficaram os velhos.E massa crítica só se atinge com certa dimensão. Espanha tem massa crítica embora forças centrífugas existam, pois Madrid quis tornar-se um buraco negro e as gentes que sabem que as suas regiões têm grande peso no PIB irritam-se… No entanto Espanha faz as coisas de forma diferente, com mais visão, tem mais gente.. O Alqueva,por exemplo  quem aproveitou mais com as obras? Portugal ou  Espanha? Quantos morreram nos incêndios de Espanha? Espanha tem mais gente apesar de também ter perdido muitas pessoas qualificadas em diversos graus, em idade ativa, para a emigração…  Se defendo federação ibérica? Não sei mesmo, e não sei por causa do buraco negro de Madrid. Só por isso: Castela quer mandar na Espanha, assim foi e assim será. E isso enerva. Mas tem massa crítica. E mais massa cinzenta, a fasquia está mais alta.





Sem sinal durante mais de duas semanas

9 11 2017

Desapareceu o sinal da MEO a 22 de Outubro ou 17 já não sei e só voltou no dia 6. Nada de tv, internet ou telefone fixo. Isto resume o que se passou e a razão pela qual este blogue se manteve em silêncio. De facto, depois de tudo o que aconteceu no dia 15 de Outubro e antes disso em Junho, só o silêncio faz sentido. Entre as duas datas o fogo continuou sem interrupções por todo o lado no país. Agora, já passaram 3 semanas, choveu, todos respiraram de alívio, os que tiveram a sorte de não terem perdido nada. Mentira, todos perdemos muito este verão. Eu diria que perdemos a inocência. Todos. Daí a necessidade de silêncio, mas  já há ruído por todo o lado, muito ruído.

Quando digo que perdemos a inocência não estou nem a dramatizar nem a ironizar . Todos os que deixaram a floresta chegar ao estado em que está têm as mãos sujas. Todos os que pactuaram com legislação facilitadora deste estado de coisas. A maioria parlamentar hipocritamente apontou o dedo ao decreto da Cristas mas a maioria nunca o revogou e  adiou a aprovação da lei da reforma da floresta que estava pronta desde Março, a própria lei aprovada (só em Julho) dá uma moratória de 180 dias ao decreto da Cristas…. até fim de Janeiro de 2018 , continua a vigorar o decreto Cristas. Portanto ninguém fica de fora. Todos os partidos. A oposição atual, tal como o PS, esteve no poder durante muitos anos, a executar a agenda das celuloses, por aí estamos conversados. Todos os partidos, portanto. Mas eu disse todos , o que inclui a população toda. Os que plantam eucaliptos para realizar dinheiro fácil a curto prazo. As associações ambientalistas que pouco se fizeram ouvir contra a eucaliptação do país. Todos nós quando achámos que havia coisas mais importantes a discutir… do futebol à Catalunha….. A carreirinha desta ou daquela profissão. O dinheirinho na continha ligeiramente aumentado pelo Centeno (até ver) que alguns acham ser uma diferença colossal em relação ao que recebiam antes… pessoas que nem olham para o recibo do vencimento, porque afinal lhes sobra sempre qualquer coisinha para passar férias no estrangeiro, para umas petiscadas. O que é preciso é ser feliz não é? Compramos uns arrozes e uns leites que colocamos no monte da “solidariedade” nos supermercados e está a andar, está cumprida a solidariedade…. acabou o tema, não se fala mais nisso, plantamos uma “arvenzinha” e vamos à vidinha, esperando que os terrenos eucaliptados que temos algures (sem saber bem onde) não tenham ardido,,, e o resto são uns tantos parolos que morreram assados , falemos da legionela pois esses já são assuntos mais graves, pessoas da capital a morrer com legionella… no Francisco Xavier, grave , gravíssimo. Corpos num velório levantados pela polícia para serem autopsiados…. depois de terem sido tratados por funerárias… par constituírem prova… contaminada acho eu, mas que interessa isso aos incompetentes , que lhes interessa o sofrimento das famílias, pessoas que não são VIPs?  O problema só é grave porque os VIPs também podem apanhar legionella….

O eucaliptal vai continuar , ninguém vai alterar nada , a crise da legionella vai continuar a ser atabalhoadamente tratada, sobretudo agora com o George jubilado…

Estou a excluir-me? não pois houve sempre outros assuntos que também coloquei à frente da questão dos fogos e do mar de eucaliptos em que se tornou o país. A luta dos professores entre 2008 e 2010 por exemplo. Alguns dirão que foi luta corporativa. Quem diz isso não entendeu nada, nadinha mesmo do que aconteceu na educação nem antes nem depois. Entretanto, corporativa ou não , a luta absorveu  muita energia. E estava à vista de todos : o mar de eucaliptos a arder num dia de vento quente, seco e forte iria matar, matar muita gente. A questão até é a inversa do que fazem normalmente: não é saber por que morreram 109 , é saber por que morreram só 109 ,  e não 1009, se as pessoas foram deixadas por sua conta, abandonadas à sua sorte, encurraladas por um mar de chamas.

E por hoje chega, que já fiz ruído a mais.